26/05/2009

Terra Sonâmbula


Mia Couto
Ndjira Editora - 2005, 5ª ediçao

Viagem onírica por duas histórias e dois grupos de pessoas e personagens que se unem no mesmo mundo. A força imperial e poderosa do "contar e ler histórias" mesmo nos momentos mais difíceis e de maior aperto. Ficam-nos o Tuahir, Muidinga e Kindzu. Deixo aqui as minhas passagens predilectas:

Eu me confortava: Nunca ninguém se tinha esquecido de nada por causa de mim.
17 A guerra é uma cobra que usa os nossos próprios dentes para nos morder. Seu veneno circula em todos os rios da nossa alma. De dia já nao saiamos, de noite nao sonhávamos. O sonho é o olho da vida. Nós estávamos cegos
31 Deixa a guerra, filho. A morte só ensina a matar.
Um regime só ganha validade, caro Estevao, é quando contra argumentos nao há factos
44 As ideias, todos sabemos, nao nascem na cabeça das pessoas. Começam num qualquer lado, sao fumos soltos, tresvairados, rodando à procura de uma devida mente.
74 Nao inventaram ainda uma pólvora suave, maneirosa, capaz de explodir os homens sem lhes matar. Uma pólvora que, em avessos serviços, gerasse mais vida. E do homem explodido nascessem os infinitos homens que lhe estao por dentro.
Em terra de cego, quem tem olho fica sem ele. O prometido é de vidro. O melhor da vida é o que nao há-de vir.
121 Nem isto guerra nenhuma é, isto é alguma coisa que nao tem nome. Antes fosse uma guerra a sério. Se assim fosse teria feito crescer o exército. Mas uma guerra fantasma faz crescer um exército fantasma, salteado, desnorteado, temido por todos e mandado por ninguém.

23/05/2009

A Viagem do Elefante


José Saramago
Caminho, 2008

É uma viagem de Lisboa a Vienna calma e bonita na sua simplicidade. Leva-nos através de lugares e personagens fascinantes do Portugal e Europa do tempo de D.Joao III, no século XVI. Pelo caminho fica um exemplo peculiar da teimosia valente dos soldados Portugueses, um curioso milagre revelador da turbulência religiosa dessa altura, uma viagem de barco, um salvamento na neve e, acima de tudo, Subhro, a personagem do Cornaca. A alma, olhos e coraçao do elefante Salomao.

19/05/2009

Quel amour d'enfant


Autora:Comtesse de Ségur
Bibliotheque Rose - 1992 - Oferecido em 1994 pela Madrinha da Carine

Esta escritora Francófona aristocrata de origem Russa do século XIX dá-nos o retrato de Gisela e da vida da sua família que gira quase completamente à sua volta. É uma caricatura do poder do filho ou filha mimada que se aperfeiçoou na arte de dominar e manipular os seus pais com vista aos seus objectivos. É a história das consequências do egoísmo, superficialidade, arrogância, de caprichos exagerados e incontroláveis. As suas muitas impertinências culminam no seu casamento com um duque aos quatorze anos, um duque mais velho cheio da guita. A sua sucessao de erros, as várias tentativas pedagógicas da sua tia e outros amigos da família e a sua assumida falta de respeito pelos pais que: ou nao sabem dizer que nao (Pai - M. de Gerville) ou nao se sabem impor (Mae - Leontine) acabam de forma triste na minha opiniao. Mesmo se ela consegue acabar por voltar a casar, já velhota aos 27 com o seu principe encantado no final, o Julien. Trágico.

18/05/2009

Big Shoot
de Koffi Kwahulé

Com: Denis Lavant

O poder de nao se matar apenas e só se nao se quiser. É esse o verdadeiro poder? Stan nunca fica de costas voltadas, sempre trabalha em prol de uma perfeita e destrutiva comunicaçao. A violencia, confusao e falta de sentido encaixam no final de maneira subtil, formando mais que uma imagem. A peça deixa-nos um travo claro e perceptível das partes mais obscuras e demoniacas do homem. Tudo transmitido através de um monólogo entre duas personagens. A mensagem vai sendo escrita nas expressoes cavadas na pele e cara desse duplo actor que inevitavelmente se acaba por destruir e canibalizar.

Sónia
de Tatiana Tolstaya

Encenador: Alvis Hermanis

Com:
Gundars Abolins
Jevgenijs Isajevs

Nesta dança a dois a pessoa solitária é aquela que nao vê a outra. Os pequenos gestos narrados do dia-a-dia ganham outra força e significado graças à profunda solidao de Sónia. Fazer um bolo de chocolate torna-se noutra coisa e ganha outro charme. Até que chega uma carta de amor fictícia que explode na vida de Sónia como uma bomba, altera a sua rotina, aspecto, casa - a sua vida. A partir daí observa-se o lento esfumar de uma vida triste mas agora com sentido, mesmo que fictício. A descida até ao fim é feita sem graciosidade mas plena de intensidade.