28/12/2014

A morte da audiência

Bruno Humberto, Dezembro 2014
Atelier Re.Al

Corajoso e deliciosamente intrusivo. Uma experiência única e inesquecível. Corre-se atrás do senhor vendado da mini bicicleta com canas, desvia-se do touro, atiram-se maçãs contra o corpo, esmaga-se o performer contra o chão, dá-se estaladas, insulta-se e chateia-se. A audiência rejubila até desaparecer. Termina-se a dançar um slow com facas atrás das costas. Único e brilhante.

Magic in the moonlight

Woody Allen, 2014, Com Colin Firth e Emma Stone

Leve niilismo céptico e delicioso, típico de Woody Allen. O poder da ilusão e magia estão, afinal, nos lugares mais óbvios de sempre: amor e vingança.

Música em Degradé

20 Novembro 2014, Meo Arena

Dá-me lume. Jorge Palma e o seu vozeirão louco e sóbrio fizeram a noite. Mar de luzes e pausa no corropio da labuta. O pequeno ensemble Allis Ubo brilhou. Apesar da acústica não facilitar, a grande orquestra  e ópera de Elisabete Matos merece a mais sincera vénia. Camané canta tão fácil, canta a
saber de um rio.

26/12/2014

Boyhood

2014, Richard Linklater
Com Ellar Coltrane, Ethan Hawke, Patricia Arquette

Ver alguém ou um grupo de pessoas a envelhecer directamente no écran, sem truques, é uma experiência que vale a pena. E a história, de um círculo de famílias a ser como as famílias são, não estraga a experiência. A vida em lento 'fast-forward'.

Interstellar

Christopher Nolan, 2014
Com Matthew Macconaughey, Anne Hathaway, Jessica Chastain

Macconaughey excelente, num ambicioso exercício sobre o futuro. Uma bela odisseia no espaço, agradavelmente louco na forma como aborda os pressupostos científicos da viagem no espaço e nos tempos. Questiona os princípios básicos da forma como projectamos o futuro. Lembra-nos os desvarios, interessantes embora às vezes cliché, que nos unem a todos: a vontade de viver, o amor.



O avarento

Moliére, Novembro 2014
Produção: Ensemble - Sociedade de Actores
Teatro Nacional D. Maria II

A miséria do avarento, que todos afasta, que todos temem, que todos chacotam. Tentou, via intermediário duvidoso, propor um negócio usurpador ao próprio filho.É divertido o apaixonar pela mesma dama com que o filho quer fugir. E o que fica, quem é ele quando se vê separado do seu tesourinho?

O processo SAAL arquitectura e participação 1974-1976


Serralves, Outubro 2014

Talvez, com os mesmo recursos, a história do SAAL merecesse mais. Sem maquetes, sem elementos contadores de histórias mas com escadas gigantes a dominar o centro da sala.
Perceptibilidade limitada em muitas das fotos dos anos 70. Gostava de ter visto uma maquete daquela linha diagonal do Gonçalo Byrne. As faixas de luta num dos recantos é desconectada e não percebo o porquê de cartazes gigantes com nomes gigantes, a perder de vista. Os objectos recolhido do processo não têm, contudo, como falhar.

Monir Sharoudy Farmanfarmaian: Possibilidade infinita. Obras em espelho e desenhos 1974-2014
Os diamantes hipnóticos, a quinquilharia de Monir são castiços.


O melhor e o mais rápido, o pior e o mais triste, o mais longo, o mais complexo, o mais difícil e o mais divertido

Tim Etchells, Outubro de 2014
Encenação, Jorge Andrade

Os temas do longo título são apenas o pretexto, o molde para conversas de gala sobre as grandes questões. Bem escrito, para rir, e emocionante. O cão salta num tapete trampolim, a senhora corre ao longo do palco, fato branco impecável, serão eles crianças inquietas em disfarce?


25/12/2014

Fernando Mendes, o Bravo cujas natas lhe escorreram pela barba

D. Afonso Henriques tinha um chefe da casa civil, o mordomo-mor, e outro da casa militar, o alferes-mor, que não se davam bem.
Num jantar, Fernão Mendes, ou seja, Fernando Mendes, sim, Fernando Mendes, pai do chefe da casa civil,  o mordomo-mor, estava a jantar com o Rei e entourage, incluindo os "inimigos" Sancho Nunes, da casa militar.

Durante o jantar, Fernando Mendes, deixa, sem querer, escorrer um pouco de natas para fora da boca e pela barba.
Os Sancho Nunes partem o côco a rir, a gozar com ele.
Fernando Mendes jura vingança naquele jantar.
Fernando Mendes rouba a mulher de Sancho Nunes-pai, com a qual fica por consentimento de D. Afonso Henriques, e também arrasa os domínios de outro gajo que lá estava sentado a rir-se.
Fim

Fontes:

p. 64 "E este foi o que levou, por prema [zanga] de el-rei D. Afonso o primeiro de Portugal uma irmã que [o rei] tinha casada com D. Sancho Nunes, porque se riram dele ante elrei por um pouco de nata que lhe corria da boca, sendo hi comendo"
'História concisa de Portugal', José Hermano de Saraiva

"Na outra pequena narrativa dos Livros de Linhagens onde surge D. Afonso Henriques, vemos o rei comendo em Coimbra na companhia de alguns dos seus cavaleiros, entre os quais dois familiares seus por afinidade, D. Sancho Nunes, referenciado como seu genro, e D. Gonçalo de Sousa, referenciado como marido da sua neta15, e ainda D. Fernão Mendes, o Bravo, senhor de Bragança. Este último torna-se motivo de chacota por parte do grupo próximo do rei, em razão de “ũa pouca de nata que (lhe) caíra pela barva”. Reagindo mal a esses risos, segue-se a ira do despeitado senhor de Bragança contra o rei e os seus fidalgos, só aplacada, segundo reza a “estória” quando este finalmente cede e lhe dá a própria filha (que subtrai ao legítimo marido, Sancho Nunes) e as terras de D. Gonçalo de Sousa, obtendo assim o desagravo contra os dois cavaleiros “chufadores”".
Graça Videira Lopes http://www.fcsh.unl.pt/docentes/gvideiralopes/index_ficheiros/modelo.pdf

http://domsanchoprimeiro.blogspot.pt/2007/07/o-alinhamento-dos-mordomos.html

Um homem muito procurado

John le Carré
Dom Quixote, 1ra edição

Não sei se foi da tradução mal conseguida mas parecem haver peças, parágrafos, palavras que não batem certo, nem parece o le Carré do "Espião que saiu do frio".

O cenário tem potencial: Hamburgo pós 11 de Setembro, a cidade onde germinou a raís do mal,  o pai checheno corrupto que pôs um banqueiro alemão a dever favores e o filho destruído a escapulir-se pela Europa até uma sociedade que não o aceita. O terrorista 95 pct bom.  Tudo isso poderia funcionar mas acaba por não acontecer. Quem comete erros de tradução do calibre apresentado em baixo, quão fiel terá sido ao trabalho original?

"Depois de tomar banho, vestiu-se para correr: calções de lycra pelos joelhos, sapatilhas, uma blusa leve para um dia quente, colete sherpa e - na mesa de bambu ao lado da porta - o capacete e as luvas de pele. " "Do Santuário pedalou a toda a velocidade até uma bomba de gasolina"
p. 154

Mas não é tudo mau. 

"Na minha faculdade de direito falávamos muito sobre a lei estar acima da vida - disse ela. - É uma verdade fundamental da nossa história alemã: a lei não para proteger a vida, mas para abusar dela. Fizemo-lo com os judeus. Na sua forma americana actual, permite a tortura e o rapto oficial. E é infecciosa. O seu próprio país não está imune, nem o meu. Eu não sirvo esse tipo de lei. Eu sirvo o Issa Karpov. Ele é meu cliente. Se isso o embaraça, não lamento."

Afonso D. Keynes Henriques

Orçamento Estado 1179 ?

"Eu, Afonso, rei dos Portugueses, considerando a minha morte e o dia do severo juízo, quando cada um será retribuído segundo as suas boas ou más acções (...), tendo ponderado diligentemente, decidi dispor de certa parte da minha fortuna, isto é, de 22.000 maravedis que tenho depositados no Mosteiro de Santa Cruz e reparti-los em benefício da minha alma depois da minha morte da forma seguinte: primeiramente à Ordem do Hospital de Jerusalém, 8.000 mosmodis (...). Para a obra de de Santa Maria de Lisboa, 1.000 maravedis. Para a obra de Alcobaça, 500 maravedis. Para a obra da igreja de Évora, 500 maravedis. Para a obra de Coimbra, 500 maravedis. Para a obra do Porto, 500 maravedis. Para a obra de Braga, 500 maravedis. Para a obra de Viseu, 500 maravedis. (...) E dei já ao abade e frades de S. João de Tarouca 3.000 maravedis, que mando sejam destinados à ponte sobre o Douro. (...) Já dei ao mestre de Évora, Gonçalo Viegas, 10.000 maravedis para serem gastos em utilidade e defesa desta cidade quando for necessário. E deixo aos pobres que existem no bispado de Lisboa 1.000 maravedis; aos pobres que vivem em Santarém, Coruche, Abrantes, Tomar, Torres Novas, Ourém, Leiria e Pombal, 1.000 maravedis (...). Ao hospital novo de Guimarães, ao de Santarém e ao de Lisboa, 260 maravedis."

p. 73 e 74 "História Concisa de Portugal" José Hermano Saraiva