19/11/2016

Porto da minha infância

Manoel de Oliveira, 2001

Uma homenagem excepcional, de facto. Autobiográfico, belo, pessoal e saudosista. O Porto antigo gravado gravado em histórias e fragmentos visuais. O Porto burguês, mas cru em que Manoel cresceu. E a hilariante cena do ladrão simpático.

Jiro dreams of sushi

David Gelb, 2011

Como é que a total obsessão pelo trabalho se pode tornar em algo tão belo, tão nobre, delicioso e profundo. Jiro Ono é exemplar, metódico, avassalador, feliz, mas algo de trágico também transparece na dificuldade e obsessão de procurar confeccionar o sushi perfeito.

The Grand Budapest Hotel

Wes Anderson, 2014
Stefan Zweig (inspirado)
Com Ralph Fiennes

Corropio de simetrias, loucuras e personagens calorosas e de enorme empatia. Um mundo de adultos, sofisticado, como que imaginado pelas melhores partes da mente de uma criança.

História que avança a forte ritmo mas, acima de tudo, um deleite visual de cores fortes e atenção aos pormenores.

16/11/2016

À flor do mar

João César Monteiro
1986
Laura Morante, Philip Spinelli

Fotografia estonteante, pura, carregada. Que luz! Robert Jordan veio de Hemingway directamente para uma simples história de Verão e praia de Portugal. Trágica e feliz. Aparentemente João César propos despedir-se, por insatisfação. Gostava de saber porquê.

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Zululuzu

2016, Teatro São Luíz
Com Pedro Zegre Penim, André Teodósio

Não está ao nível dos brilhantes Eurovision, Tropa Fandanga, Tear Gas e Padam Padam. Diverte sim, mas parece que se perdeu na metacrítica em demasia, nos debates e lutas de egos que escapam aos que não pertencem ao meio. Algo não encaixa como encaixou.

The intern

2015, Nancy Meyers
Robert de Niro, Anne Hathaway, Rene Russo

Tão leve que voa. De Niro é um perfeito senhor. Talento desperdiçado nesta história cor-de-rosa que se digere com facilidade.

Belarmino

1964, Fernando Lopes

Cru e surpreendente, o Belarmino tem toda a vida do mundo nele e toda a mágoa também. Um fanfarrão vadio, pobre e todo-poderoso. Um Mayweather português, mas com muito mais nível. Pobre, engatatão e obstinado.

- Estive dois meses no Porto. Fiz cinco combates dos quais só recebi um par de sapatos já em segunda mão. Uma gabardine custou-me 900 escudos. E deu-me no dia de Natal 150 escudos para ir passar o Natal com a minha família.

- Sei que queres ir trabalhar para o estrangeiro, mas tu és um homem de Lisboa, não vais sentir saudade da cidade?
- Sim, muitas (...).
- Então porque vai trabalhar para o estrangeiro? 
- Porque boxing em Portugal não há, e eu vou para o estrangeiro apenas para ser treinador ou jogar boxe. Só vou para dar porrada, porque levar já não posso. Já não tenho idade, tenho 32 anos.

- Não há engenheiros e arquitectos que vão para o desporto e levam porrada na cabeça por gosto. São homens como eu, vadios.

14/11/2016

Daytripper

Fábio Moon e Gabriel Bá, 2011

Tanta morte e tragédia, de forma tão sublimemente desenhada e escrita que não se tornam nada mais que uma ode à vida e ao que tantas vezes nos esquecemos de procurar nela.


Rio de Ouro

Paulo Rocha, 1998
Lima Duarte, Isabel Ruth

Paulo Rocha é um artista das imagens, da fotografia. Capturou Portugal como poucos. A guarda-freio talvez seja um bom exemplo do louco e invejoso lado negro da nossa nação.

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Mudar de Vida

Paulo Rocha, 1967

Era Maria Barroso. Só percebi a meio. Cenas incríveis de pescaria. O trabalho sempre um tema central de Paulo Rocha. Mais uma obra de arte.

Gosto muito da cena em que apanha madeira.

Silvestre

João César Monteiro, 1981
Maria de Medeiros, Teresa Madruga, Luís Miguel Cintra, Jorge Silva Melo

Maria de Medeiros, lançada aos lobos, corta as mãos de pesadelos e de estranhos diabos. Um sonho assustado e mais uma delicada viagem por trás-os-montes.
Festival de Veneza - Selecção Oficial


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Veredas

João César Monteiro, 1977

Trás-os-Montes sonhado, desenhado a camera de filmar. Em que os habitantes vão sobrevivendo explorados por senhores e Deuses.

06/09/2016

The grapes of wrath

John Steinbeck, 1939 (Penguin 2014)

Homenagem à avassaladora vontade de viver e defender a família o melhor que se pode. Família que pode ser todo um povo, todo um grupo frágil. A fome e desespero por trabalho. O instinto maternal, o amor, respeito e obsessão pela terra que nos sustenta, a sobreporem-se aos medo da agressividade sobre os fracos. A inveja e falta de empatia de um passado que é presente.

94 All of them were caught in something larger than themselves. Some of them hated the mathematics that drove them, and some were afraid, and some worshiped the mathematics because it provided a refuge from thought and from feeling.

95 A man can hold land if he can just eat and pay taxes; he can do that (...) But - you see, a bank or a company can't do that, because those creatures don't breathe air, don't eat side-meat. They breathe profits; they eat the interest on money. If they don't get it, they die the way you die without air, without side-meat.

96 Maybe the next year will be a good year. God knows much cotton there will be next year. And with all the wars. God knows what price cotton will bring. Don't they make explosives out of cotton? And uniforms? Get enough wars and cotton will hit ceiling. Next year, maybe.

Her full face was not soft; it was controlled, kindly. Her hazel eyes seemed to have experienced all possible tragedy and to have mounted pain and suffering like steps into a high calm and a superhuman understanding. She seemed to know, to accept, to welcome her position, the citadel of the family, the strong place that could not be taken. But better than joy was calm. Imperturbability could be depended upon. And from her great and humble position in the family she had taken dignity and a clean calm beauty. From her position as healer, her hands had grown sure and cool and quiet; from her position as arbiter she had become as remote and faultless in judgment as a goddess.

192 For nitrates are not the land, nor phosphates; and the length of fiber in the cotton is not the land. Carbon is not a man, nor salt, nor water nor calcium. He is all these, but he is much more, much more; and the land is so much more than its analysis. (...) That man who is more than his elements knows the land that is more than its analysis. But the machine man, driving a dead tractor on land he does not know and love, understands only chemistry; and he is contemptuous of the land and of himself. When the corrugated iron doors are shut, he goes home, and his home is no the land.


215 Listen to the motor. Listen to the wheels. Listen with your ears and with your hands on the steering wheel; listen with the palm of your hand on the gear-shift lever; listen with your feet on the floor boards. Listen to the pounding old jalopy with all your senses, for a change of tone, a variation of rhythm may mean—a week here? That rattle—that’s tappets. Don’t hurt a bit. Tappets can rattle till Jesus comes again without no harm. But that thudding as the car moves along—can’t hear that—just kind of feel it. Maybe oil isn’t gettin’ someplace. Maybe a bearin’s startin’ to go. Jesus, if it’s a bearing, what’ll we do? Money’s goin’ fast.

258  The last clear definite function of man—muscles aching to work, minds aching to create beyond the single need—this is man. To build a wall, to build a house, a dam, and in the wall and house and dam to put something of Manself, and to Manself take back something of the wall, the house the dam; to take hard muscles from the lifting, to take the clear lines and form from conceiving. For man, unlike any other thing organic or inorganic in the universe, grows beyond his work, walks up the stairs of his concepts, emerges ahead of his accomplishments.

268 The turntable drops down and the record swings into its place in the pile. The purple light goes off. The nickel, which has caused all this mechanism to work, has caused Crosby to sing and an orchestra to play, this nickel drops from between the contact points into the box where the profits go. This nickel, unlike most money, has actually done a job of work, has been physically responsible for a reaction.

319 At first the families were timid in the building and tumbling worlds, but gradually the technique of building worlds became their technique. Then leaders emerged, then laws were made, then codes came into being. And as the worlds moved westward they were more complete and better furnished, for their builders were more experienced in building them.

336 If he needs a million acres to make him feel rich, seems to me he needs it 'cause he feels awful poor inside hisself, and if he's poor in hisself, there ain't no million acres gonna make him feel rich, an' maybe he's disappointed that nothin' he can do 'll make him feel rich – not rich like Mis Wilson was when she give her tent when Granpa died.

355 It don't take no nerve to do somepin when there ain't nothin 'else you can do.

370 The Mexicans were weak and fled.  They could not resist, because they wanted nothing in the world as frantically as the Americans wanted land.
Then, with time, the squatters were no longer squatters, but owners; and their children grew up and had children on the land.  And the hunger was gone from them, the feral hunger, the gnawing, tearing hunger for land, for water and earth and the good sky over it, for the green thrusting grass, for the swelling roots.  They had these things so completely that they did not know about them any more.  They had no more the stomach-tearing lust for a rich acre and a shining blade to plow it, for seed and a windmill beating its wings in the air.  They arose in the dark no more to hear the sleepy birds’ first chittering, and the morning wind around the house while they waited for the first light to go out to the dear acres.  These things were lost, and crops were reckoned in dollars, and land was valued by principal plus interest, and crops were bought and sold before they were planted.

373 And the laboring people hated Okies because a hungry man must work, and if he must work, if he has to work, the wage payer automatically gives him less for his work; and then no one can get more.
And the dispossess, the migrants, flowed into California, two hundred and fifty thousand, and three hundred thousand.  Behind them new tractors were going on the land and the tenants were being forced off.  And new waves were on the way, new waves of the dispossessed and the homeless, hardened, intent, and dangerous.
And while the Californians wanted many things, accumulation, social success, amusement, luxury, and a curious banking security, the new barbarians wanted only two things--land and food; and to them the two were one.

443  The great companies did not know that the line between hunger and anger is a thin line. And money that might have gone to wages went for gas, for guns, for agents and spies, for blacklists, for drilling. On the highways the people moved like ants and searched for work, for food. And the anger began to ferment.

501 The story tellers, gathering attention into their tales, spoke in great rhythms, spoke in great words because the tales were great, and the listeners became great through them.

17/07/2016

O primeiro periódico português

O número 1 do primeiro periódico português foi publicado em Dezembro de 1641. Chamava-se ‘
Gazeta em Que Se Relatam as Novas Todas Que Houve nesta Corte e Que Vieram de Vários Países’.
A manchete de primeira página foi sobre um Beirão.
Na aclamação de Dão João IV, desprendeu-se Cristo de um crucifixo e ficou em gesto de abençoar. Este momento foi eleito milagre. Mais tarde, o tal Beirão, à conversa com os amigos, sugeriu que o momento foi responsabilidade do acaso. Logo depois, caiu-lhe um muro em cima. Morreu e virou primeira página.
O lead da altura tem a informação toda, mas não deve ter ganho prémio.
“Num lugar da Beira se afirma que um homem que, ouvindo dizer numa conversação de amigos que na feliz aclamação de el-rei nosso Senhor fizera o crucifixo da Sé o milagre que a todos é notório, disse que podia acaso a imagem do Senhor despregar o braço. E assim como acabou de dizer estas palavras, caiu uma parede junto da qual estavam todos os da conversação e só a ele matou”.

10/06/2016

The celebration

1998, Thomas Vinterberg

Um filme dogme 95.

Que escândalo. Quem o provoca não foi quem estava à espera. Ignorar monstruosidades para manter a boa ordem das coisas é um pecado fácil e repetitivo nas famílias.

Escolha se prefere o discurso amarelo ou verde. Seriam iguais. Seria mesmio uma escolha.

Fantástico fim. Apreciado o amor do 'dogme' pelos básicos de contar uma história e a vida.

Lobster

Yorgos Lanthimos, 2016
Com Colin Farrell, Rachel Weisz, Ben Whishaw, John C. Reilly

O totalitarismo de 1984, salpicado de inquietude e contenção. David quer ser uma lagosta para viver mais de 100 anos, mas acaba com a mão torturada por torradeiras e o irmão pontapeado.

Simular a compatibilidade pode ser muito doloroso. Os solitários também vivem em clãs e são perigosos.

Acho que ele não arrancou os olhos.


25/05/2016

Dheepan

Jacques Audiard, 2015
Com Antonythasan Jesuthasan

Comovente é a força dos humanos. Quado as luzes piscam não são dos barcos, mas os plásticos de laços triestemente à venda. A redenção custa a encontrar e é escrita a sangue. O amor brota até do convívio por necessidade. Adoro a intensidade crua de Dheepan, a sua falta de sentido de humor. Gostei de ver Yalini a crescer e de ver Illayaal a crescer ainda mais rápido.


Look who's back

David Wnendt, 2015

Com Oliver Masucci

Cómico e inquietante. Uma enorme e inteligente crítica, hilariante e dissimuladamente acusadora. Um sério aviso para os nossos tempos. Uma ideia simples e genial: e se Hitler acordasse hoje? Ninguém o leva a sério, mas a recepção é calorosa, desconfortavelmente mais que jocosa. O homem tem qualquer coisa e não é boa. Corajosa viagem. Genial performance de Oliver Masucci.

27/04/2016

Verdes Anos


Paulo Rocha, 1963
Com Isabel Ruth, Rui Gomes, Ruy Furtado, Cândida Lacerda

Estonteante esta Lisboa de modernidade adolescente. Limpa e inquietante, parece que Júlio adivinhou o lado negro do futuro da cidade e, focado apenas nisso, enlouquece. Ilda, tão bela e tão pura, arrebata a cidade, quer conquistá-la, mas falha. O provincianismo mata, ou fio a cidade?



A conquista do Pólo Sul

Manfred Karge, Beatriz Batarda, 2016, São Luiz
Com Bruno Nogueira, Nuno Lopes, Ana Brandão, Flávia Gusmão, Miguel Damião, Nuno Nunes, Romeu Costa

Esta viagem conquista o Pólo mais a sul de todos, o que está em nós: frio e solitário. Resgatado pela amizade, a quimera vai prosseguindo mágica, difícil e dolorosa, mas sempre prosseguindo. Os falhanços de Shackelton e amigos não serão eles, de facto, mais meritórios do que o sucesso do Slupianek? Eu acho que sim.


Il nome del figlio

Francesca Archibugi, 2015
Com Alessandro Gassman, Rocco Papaleo

Sobre a amizade e irmandade. Surpreendente e divertido. Simples. Ao longo de um jantar viaja-se pela vida passada, abrem-se e cauterizam-se feridas e ri-se muito. Benito é um nome assim tão grave, tão mau? Cuidado com a ameixa.

01/04/2016

Posto Avançado do Progresso

2016, Hugo Vieira da Silva
Com Nuno Lopes, Ivo Alexandre, David Caracol

Enorme beleza. Juntamente com José de Mattos e Sant'Anna, somos rapidamente capturados naqueles poucos metros junto ao posto avançado que, de progresso, tem pouco. Capturados, apesar da conhecida imensidão e beleza da selva africana. Esta apresenta-se como um lento, belo e aborrecido pesadelo. Sem a exuberância e os clichés ao por-de-sol encarnado. Necessária metáfora para o colonialismo, para a ridícula e solitária construção da sua identidade. Queremos beber, jogar à sueca e medir árvores à medida que enlouquecemos. Mas não tanto que fosse necessário acelerar até àquela morte.

Trois couleurs:blanc

1994, Krzysztof Kieslowski
Com Zbigniew Zamachowski, Julie Delpy

Belíssimo conto sobre a igualdade e falta dela, na integração num novo país, na reciprocidade do amor, na vingança, por vezes tão crua na sua espontaneadade como quando perversamente planeada.


Steve Jobs

Danny Boyle 2015
Com Michael Fassbender, Kate Winslet, Seth Rogen, Jeff Daniels,Sarah Snook

Curiosa estrutura escolhida para o filme, cujos blocos de cenas terminam antes do climax da apresentação de cada novo produto. Tudo lhe acontecia antes disso. Conhecemos o seu temperamento difícil, desconexão familiar e brilhantismo.

Spotlight

Tom McCarthy, 2016

Com Mark Ruffalo, Michael Keaton, Liev Schreiber, Rachel McAdams, Stanley Tucci

Inspirador. Excelentes actores. Quasi-documentário sobre os dilemas e as dinâmicas do jornalismo moderno. Um exemplo e ode a uma profissão amada e abalada.

30/03/2016

Children of Men

2006, Alfonso Cuarón
Com Clive Owen, Julianne Moore, Chiwetel Ejiofor, Michael Caine

Neste futuro tão familiar, o mundo envelheceu esquecido das crianças, balcanizou-se.

Perdeu-se na inveja e ódio. Numa guerra que pausa breve, procuramos uma saída enevoada. Superiormente filmado. Acção non-stop.

Meia Maratona de Lisboa EDP 2016

20 Março 

21,1 km em 1 h 56 m 45 s

Épica, dura, brilhante. Recordista no tempo e uma bonita prova de amizade VIP. Inesquecível ceviche. Registada numa caneca. 

Meia Maratona de Lisboa EDP 2015

22 Março 

21,1 km em 
2 h 12 m

A primeira meia maratona. Foi preparação para Bordéus, a ritmo lento.


Mesmo assim, uma grande emoção. 

Corrida dos Descobrimentos 2015

10 km dos Descobrimentos
5 Dezembro 2015
Com o Rui

1 h 2 min.
Longe dos melhores tempos. É sempre um momento de prazer e orgulho correr com o primo.
Seguiu-se a um memorável jantar de amigos, mesmo que não mais que um entre tantos outros.

Alma

20 Fevereiro 2016
Henrique Sá Pessoa

Macarron de chocolate com foie gras e vinagre balsâmico.
Creme de bacalhau com natas
Crocante de tapioca

Carapaus marinados
Caldo Tomate
Pimentos ao carvão, com molho pimentão

Filete de pescada com alho francês, avelãs, puré de batata e molho hollandaise com dijon
Entrecôte de novilho mousseline de aipo, pickle de beterraba, molho barbecue

Pão de alfarroba, manteiga fumada
Pão de milho e batata doce, azeite alma

Pastel de nata casa-croquete
Trufa crocante
Madalena de Pistáchio
Sorbet de maçã Granny Smith com merengue de caipirinha

Vinho Tyro Branco
Gavião tinto Alentejo Lapa dos Gaviões


28/02/2016

As Bodas de Deus

João César Monteiro, 1999
Com Rita Durão, Joana Azevedo e Luís Miguel Cintra

A fortuna bate à porta quando Luís Miguel Cintra a entregar uma mala de dinheiro a João de Deus, transformando-o no Barão de Deus.

Memorável sarça ardente, a Traviata no camarote presidencial do São Carlos e uma noite de amor surpreendente, em que César expõe a sua fragilidade de forma corajosa e bela.

"- Tome lá cem escudos. Mas não gaste tudo em vinho. - Deus a abençoe Madre Abadessa, por esta santa esmolinha. - Que Deus o acompanhe. - Mais vale só que mal acompanhado. … - Ó Agostinho, toma lá cem dólares, mas não gastes tudo em freiras. - Muito obrigado meu bom senhor"


 “- Será da minha vista ou as maminhas também te cresceram? (...) Achas que posso ver só uma? Tenho estado a pão e laranjas”.

Andrei Rublev

Andrei Tarkovsky, 1973

Rublev é apenas a desculpa para pintar um mundo de convulsão, destruição e caos, sempre belo e surpreendente. Rico de segredos e magia. A construção do sino, de proporções épicas, é incrível. Obra de arte.

09/02/2016

Vou para casa

Manoel de Oliveira, 2001
Com Michel Piccoli, John Malkovich

A metáfora é maior do que eu pensava. O caminho das máquinas, da opressão maquinal que nos pressiona até desejarmos voltar para o ventre da mãe, para casa. Baseado em factos reais, este é das mais belas peças criadas por Manoel. Lindo de morrer. Paris capturada no agora. Uma ode ao teatro, à intersecção do teatro e cinema com a vida real. Brilhante.

08/02/2016

Palavra e Utopia

Manoel de Oliveira, 2000
Com Luís Miguel Cintra, Lima Duarte, Leonor Silveira, Ricardo Trêpa

Pai da palavra e utopia portuguesa. Da liberdade, do futuro, aventura, trabalho e entrega. Escritor, orador e pensador virtuoso. De facto, calham bem a Oliveira as palavras: "servir aos futuros, pagar aos passados e não dever nada aos presentes".

"Finalmente, vossa Reverendíssima me diz que não sabe a resolução que se tomará em Lisboa, e lhe parece que Sua Majestade se lançará de fora. Eu o quisera muito metido de dentro, porque vi cartas de alguns que não estão mui longe dos seus ouvidos", Padre António Vieira, Séc. XVII, que escreveu, não estou a brincar, um livro chamado 'História do Futuro'.

Purity


Jonathan Franzen, 2015
Fourth Estate - London

A pureza é afinal impossível, a não ser que a tomemos por obsessão. A frustração de falhar nas relações amorosas, familiares e laborais. Segredos desvendados atrás de segredos, visões e vozes que se cruzam, o tempo utilizado de forma elástica.

6 All these good-hearted San Lorenzo Valley types had glimpsed in Pip's mother what Pip herself, in her early teens, had seen and felt proud of: an ineffable sort of greatness. You didn't have to write to be a poet, you didn't have to create things to be an artist. Her mother's spiritual endeavor was itself a kind of art - an art of invisibility. There was never a television in their cabin and no computer before Pip turned twelve; her mother's main source of news was the Santa Cruz Sentinel, which she read for the small daily pleasure of being appalled by the world.

45 Garth and Erik imagined a labor utopia. Their theory was that the technology-driven gains in productivity and the resulting loss of manufacturing jobs would inevitably result in better wealth distribution, when capital realized that it could not afford to pauperize the consumers who bought its robot-made products.

103 As the chief state economist, he was responsible for the wholesale massaging of data, for demonstrating increases in productivity where there weren't any, for balancing a budget that every year drifted farther from reality, for adjusting official exchange rates to maximize the budgetary impact of whatever hard currency the Republic could finagle or extort, for magnifying the economy's few successes and making optimistic excuses for its many failures. The top party leaders could afford to be stupid or cynical about his numbers, but he himself had to believe in the story they told. This required political conviction, self-deception, and, perhaps especially, self-pity.

180 The leading occupational hazard of Leila's job was sources who wanted to be friends with her. The world was overpopulated by talkers and underpopulated by listeners, and many of her sources gave her the impression that she was the first person who'd ever truly listened to them.

187 On a rare good day, he might produce a long paragraph - disconnected, like all its fellows, from any other paragraph - that made her hoot with laughter.

202 "I'm sorry", she said. "But I wouldn't be a responsible journalist if I didn't hear your side of the story. "There is no story". Well, see, but that's a side itself. Because other sides are saying there is a story.

204 The irony of the internet is that it's made the journalist's job so much easier. You can research in five minutes what used to take five days. But the internet is also killing journalism. There's no substitute for the reporter who's worked a beat for twenty years, who's cultivated sources, who can see the difference between a story and a non-story. Google and accurint can make you feel very smart, but the best stories come when you're out in the field. Your source makes some off-hand remark, and suddenly you see the real story. That's when I feel most alive, when I'm sitting at the computer I'm only half-alive.

492 He was so immersed and implicated in the internet, so enmeshed in its totalitarism, that his online existence was coming to seem realer than his physical self. Who even cared what a person's private thoughts about him were? Private thoughts didn't exist in the retrievable, disseminable and readable way that data did. The aim of the internet (...) was to liberate humanity from the tasks - making things, learning things, remembering things - that had previously given meaning to life and thus had constituted life. Now it seemed as if the only task that meant anything was search-engine optimization.

539 The world ... an eternal struggle for power - power, power power: how could the world be organized around the struggle for something so lonely and oppressive in the having of it, Secrets were power, money was power, being needed was power.

546 Yes, a kind of heaven: long rallies on an autumn evening, the exercise of skill in light still good enough to hit by, the faithful pock of a tennis ball. It was enough.
The sun went down, the air was deliciously cool, and they kept hitting, the ball bouncing up in a low arc. That instant of connecting, the satisfaction of reversing the ball's inertia, the sweetness of the sweet spot (...) perfect contentment.

526 Could a more perfectly manufactured object than a tennis ball be imagined? Fuzzy and spherical, squeezable and bouncy, its stitching a pair of matching tongues, its voice on impact a pock in the most pleasing of registers.

10/01/2016

Locke

2014, Steven Knight, com Tom Hardy

O poder da interpretação, de ir construindo as peças do puzzle de quem alguém é, qual a sua história, tudo durante uma viagem, sempre dentro do carro. Só com uma personagem principal a falar em alta voz. Quem diria que funciona tão bem.

A juventude

Paolo Sorrentino, 2015
Michael Caine, Harvey Keitel, Paul Dano, Jane Fonda

Obra prima visual, num surreal purgatório: belo, rico, profundo. Coisas maravilhosas: o monólogo da Rachel Weisz na marquesa da massagem; o suicídio; Michael Caine no geral; Maradona ouve a conversa na piscina e vem ter com a malta dizer que também é canhoto;  pequeno-almoço com o Hitler; a Miss Universo.













The big short

Adam McKay, 2015
Com Christian Bale, Steve Carell, Ryan Gosling, Brad Pitt

Aquele 'crash' que, por mais vezes que a história se repita, tão poucos previram na sua dimensão. As repercussões desta bolha ainda explodem hoje nas nossas mãos. Em retrospectiva era óbvio. Muito bem contado: uma excelente conjugação de explicação e entretenimento.

02/01/2016

Recordações da Casa Amarela

1989, João César Monteiro


Obra-prima. João César Monteiro em todo o seu esplendor: obsessivo, divertido, sarcástico, perigoso, intenso e alucinado.

Mostra-nos uma Lisboa tonta, decadente e estonteante entre a casa dos bicos e o panóptico do hospital Miguel Bombarda.  João de Deus é um corpo decadente como a cidade, como o país, como o bairro. Adorei! Adorei! Adorei!


João César Monteiro - Os primeiros filmes

João César Monteiro

Lusomundo
Editado com a colaboração especial da Cinemateca portuguesa - museu do cinema


Sophia de Mello Breyner Andresen, 1970
Muito mar num documento surpreendente. Sente-se o círculo pequeno e o meio onde vivia a escritora, dedicação aos filhos, entre eles um jovem Miguel Sousa Tavares, praia e conversas sobre escrita e poesia.



Quem espera por sapatos do defunto morre descalço, 1970-71
Lisboa como foi. Procurar os mortos para penhorar sapatos. O início do fascínio de João César Monteiro pelos pelintras e trapaceiros. A primeira aparição de Luís Miguel Cintra.



Fragmentos de um filmes esmola 1972-77
Não sai do quarto, mete máscara de porco e ataca o sogro quando se passa. Uma gentil loucura que todos temos, levada ao extremo.



Que farei eu com esta espada? 1975
Marinheiros no Cais do Sodré. Quem o viu e quem o vê. Soldados dos Estados Unidos e Holandeses no Castelo e na baixa que não sabem nada sobre nada. Meninas de discurso profundo.